terça-feira, abril 15, 2008

Conversa com Jesus...


Jesus está descontente com a humanidade e com a própria Igreja Católica Apostólica Romana...
Estava em meditação transcendental e, de repente, surgiu-me Ele, envolto em túnica escura, mais parecendo um pescador preparado para ir ao mar, rosto tisnado pelo sol, ar preocupado...
E começou a falar assim:
- O mal dos nossos tempos, caro rouxinol, é o império do vil metal. Controla tudo, a ele todos se vergam...
- Eu sei bem, Mestre, todos somos levados a isso, esta sociedade mercantilista faz um preço para tudo...
- Mas há que corrigir este trajecto. A própria Igreja tem embarcado nele, com resultados catastróficos...
-Como assim?!
- Olha, esta proliferação de Senhores (Senhor dos Aflitos, do Bom Conselho, dos Bem Guiados, dos Mal-Guiados, etc...) mais parece aquele conjunto de heterónimos do Fernando Pessoa. Há um aproveitamento abusivo da imagem de Jesus para fins comerciais, mercantilistas. A minha Mãe, a Virgem Maria , também está a ser comercializada pela Igreja de forma escandalosa: Senhora do Ó, Senhora do Amparo, Senhora da Saúde, Senhora das Dores, Senhora de Lurdes, de Fátima, de Caravaggio, eu sei lá... isto tem que ter fim, senão é o descrédito total...
- Mestre, eu nunca tinha reparado nisso, mas tendes razão. Por que será?
- Olha rouxinol, disse Ele cofiando a barba com ar de preocupação , desde os tempos de Lutero que tem havido uma consciencialização cada vez maior desta apetência da Igreja: dinheiro por contrapartida de indulgências, bênçãos, promessas de vária ordem...
- Mas sois por Martinho Lutero? Ele revoltou-se...
- Eu estou revoltado. Ele tinha toda a razão. Agora estamos a caminhar na mesma senda. Olha para o aproveitamento político da Igreja feito por alguns políticos aí de Portugal: Jardim, Fátima Felgueiras, isto é o descrédito total! O ir a Fátima muitas vezes não vai dar santidade nenhuma às pessoas. Os actos é que são o espelho dessa santidade. O resto são tretas!
- Jesus, Vós sois adepto da Teoria Behaviourista, estou vendo...
- Não, não é isso. É ridículo pensar-se que ir a Meca ou a Lurdes ou a Jesusalém ou a Caravaggio, vai mudar o estatuto das pessoas. Por trás de muitas peregrinações há um comércio desenfreado, uma cobiça por dinheiro que faz sofrer toda a gente de bom senso, e até Eu não me sinto bem com esta exploração...O turismo religioso é a causa das guerras sucessivas no Médio Oriente. Com este fanatismo doentio, a religião é um «ouro negro»...
-Mas, sois contra as peregrinações?
- Não por elas em si. Sou contra excessos. Sou contra exploração da credulidade das gentes. Sou pela simplicidade, pela prática de bons actos e não pela exibição ridícula de estados de alma: procissões faustosas, dourados nas indumentárias e nas ornamentações dos templos, fausto e magnificência estultas... sermões e missas cantadas, folclore e mais folclore, só para encher o olho ao papalvo, para exibir sinais exteriores de fé, num farisaísmo que tresanda... parecem os fariseus do meu tempo lá na Galileia...
- Mas temos que coexistir com eles,não é Mestre?
- Infelizmente sim. Mas eles são os vendilhões do templo: querem vender imagem de políticos, querem fazer-se notados com as suas benemerências ostentatórias para colherem dividendos de diversa índole... Tantos que vemos irem a Fátima e a chamarem a comunicação social para tirar fotos para depois divulgar junto da populaça, estilo «olha fulano de tal, tão bom, tão crente, tão temente a Deus», mas na prática, sendo os facínoras mais cruéis, as criaturas mais demoníacas...
- Estais a referir-Vos a quem?
-A ninguém em concreto, mas a muita gente, de facto. Vós todos os conheceis. Servem-se da religião para se promoverem politicamente, desportivamente, socialmente. Acho aberrantes esses comportamentos ostentatórios... são os Frei Tomás!
-Mas o mundo está cheio de homens de fé externa. Será que também não concordais com a feitura da Basílica em Fátima?
- Para quê? Mais uma obra faraónica para mostrar o poder económico de uma religião que atrai multidões. Há tantas carências por aí. Há tanta gente a precisar de amparo. Tanta miséria, às vezes envergonhada, tanto doente a precisar de apoios, tantas mortes em África, na Ásia, sei lá, a Igreja devia fazer uma profunda autocrítica sob pena de se afundar ainda mais... Até o problema do controlo da natalidade é importantíssimo. Com a delapidação de recursos naturais, há que conter esta expansão demográfica galopante que conduz a mais fome, a mais miséria, a mais desumanidade!
-Que achais do nosso Papa, Bento XVI, uma sumidade em termos doutrinários!...
- Coitado, ele é mais vítima das circunstâncias. Está rodeado de gente preconceituosa, de gente sem uma visão estratégica, sei lá, se ele fosse seguir os meus pensamentos eram capazes de o crucificarem com termos como: «radical», «revolucionário», «utópico»... Hoje em dia, quem não alinhar pelo diapasão reinante (as modas são terríveis, são jugos, são grilhões, são algemas...) é logo lançado às trevas... Se daqui a cem anos forem observar o que este papa pensa, o que ele diz, os conceitos de moral que ele apregoa, hão-de rir-se concerteza!...
-E que achais dos árabes? Estão no bom caminho?
-Coitados, esses estão em termos evolutivos na treva mais densa e no subdesenvolvimento moral mais retrógrado. Tenho pena deles...
-- Que propondes, Divino Mestre, para alterar o «status quo»?
-Olha rouxinol, tu que és tão original nos teus conceitos, na tua abordagem das temáticas morais e religiosas, dá uma resposta por mim. Alivia o calvário de toda esta gente martirizada por preconceitos, escravizada por padrões retrógrados, conduzida por políticos aldrabões e oportunistas que se aproveitam da boa fé de alguns párocos e da ingenuidade das populações para se deleitarem e até gozarem com a situação. Isto é o pauperismo moral e ético mais degradante. Isto é o subdesenvolvimento em todos os parâmetros.

Por favor, rouxinol, sê, à tua maneira ,um apóstolo da nova era, expulsa com o chicote da tua sátira, os vendilhões da política, da religião, da cultura... eu confio em ti.

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