segunda-feira, fevereiro 02, 2009

Fernando Namora, recordar um Mestre...


Fernando Namora um escritor-médico que continua omnipresente. Faleceu a 31.01.89 mas a sua memória continua sempre no pensamento daqueles que com ele privaram, que com ele partilharam afectos, desilusões, ideias.
Só falei com ele uma vez. Sei que era sogro do escritor bracarense José Manuel Mendes (então deputado comunista e hoje presidente da APE). Em plena Av da Liberdade, à saída do semanário «O JORNAL», de Letria e de José Carlos de Vasconcellos. Mais tarde, por duas vezes, tivemos oportunidade de trocar correspondência sobre os seus pontos de vista no tocante ao evoluír da chamada «Revolução dos Cravos».
Ele pronunciava-se com certa amargura e desencanto nos seus «Cadernos de um Escritor». Eu procurei ir um pouco ao encontro das suas preocupações. Também preocupado com os excessos e as indecisões de um tal «Cortiça» que flutuava ao sabor dos águas, sem tomar posição sobre alguns desmandos então ocorridos.
Sei que o seu ponto de vista era mais conservador que o meu e por maioria de razão, do do seu genro, JMM. Ainda guardo religiosamente essas cartas, numa escrita muito peculiar, num estilo muito sui generis...
Foi um precursor do neorealismo bem evidenciado no Novo Cancioneiro. O seu método de escrita, a sua argúcia psicológica, a sua mão de médico capaz de aprofundar a patologia social veio ao cima no «verão quente de 1975» em que foi dos mais sérios e conscientes críticos dos excessos comunistas e afins. Sem medo de ser apodado de «reaccionário» (como era moda então...) vergastou com acerada precisão aquelas atitudes pacóvias de um revolucionarismo voluntarista e exibicionista de alguns caudilhos de pacotilha.
A sua argúcia, o seu sentido profético, a sua análise atenta e judiciosa à realidade, ainda hoje fazem falta nesta sociedade patológica em que os mais lúcidos são enxovalhados por autênticos histriões que usam e abusam de certo mediatismo fácil para se alcandorarem ao patamar de «pensador» ou de «educador da plebe». Ele sim, era um autêntico pensador, um cirurgião das ideias e um bastião dos direitos cívicos. Esta democracia pré-cadavérica precisa de ser lancetada pelo bisturi da crítica superior e genial de algum Namora que ainda penso poder existir neste cantinho da Lusolândia. Que faz falta isso faz...
Hoje vemos medíocres plumitivos que por serem expostos nos altares mediáticos do status quo já se imaginam fulgurantes criadores dignos de ombrearem com Victor Hugo, Shakespeare ou Camões. Escrevem ao quilo e à tonelada mas ficam muito aquém do merecimento intrínseco deste grande pensador. Este era uma árvore frondosa na floresta das Letras. Estes são arbustos rasteiros sem craveira, sem envergadura, sem dimensão ética ou deontológica.

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