sábado, novembro 03, 2007

Carta aberta a Benedictus XVI


Benedictus XVI, o nome escolhido por Joseph Ratzinger, ficará na História. Como? Só ele o dirá com a sua prática, o seu exemplo, a sua acção cívica e pastoral. Tentando (modestamente) contribuír para uma melhoria da Igreja Catrólica, aqui vai este singelo contributo de alguém que sente a injustiça reinante e quer ver mudada a praxis vigente.
A:
Basílica de S. Pedro (Fax: 39.06.698.85518)
Com conhecimento de :
L'OSSERVATORE ROMANO E-mail: ornet@ossrom.va
Caríssimo Papa:
Antes de mais as minhas desculpas por não usar aquela terminologia de Sua Santidade, pois sei que não gostais de lisonjas nem de subujismos pouco dignificantes. Ainda não sois santo, daí ser abusiva a terminologia. Seria ferir a vossa consabida modéstia...
Às vezes sinto-me como aquele Galilei Galilei que afirmava não ser o sol que girava mas sim a Terra, perante a fúria de toda a Igreja Católica e de todo o mundo civilizado de então. Sinto-me como aquele menino que via o rei a seguir nu, todo impante no seu cavalo, perante o aplauso da multidão acéfala, sem coragem para dizer a verdade ao rei.
Há muita falta de CORAGEM. A Igreja precisa de gente capaz de dizer com coragem o que precisa de ser dito. Sei que dói, por vezes, dizê-la, mas alguém terá de assumir esse papel. Terá que haver um menino para dizer averdade ao rei...
Nessa qualidade me dirijo ao humilde servo da vinha do Senhor, na minha qualidade de servo da mesma vinha.
Sei que é duro o que vou dizer. Sei que vai causar embaraço, mas tem que ser dito. Deus me perdoe se erro. Faço-o com recta intenção, de peito aberto às balas de todos os vendilhões desta vinha às vezes tão atacada pela filoxera do farisaísmo e da corrupção...
A IC em Portugal tem virtualidades e defeitos. É de enaltecer o seu esforço para se adaptar a uma realidade hodierna, cheia de tentações e de perversões.
Tem-se vindo a constatar uma osmose (diria mais: um conúbio) entre o poder clerical e o poder político, havendo sinais pouco dignificantes para ambas as partes. O que se passa na Madeira com subsídios chorudos (a rondar os cinco milhões de euros) do governo regional para o Jornal da Madeira (jornal da diocese) assume foros de "compra de consciências"... Se o jornal usasse essas verbas para matar a fome e socorrer os deserdados da sorte, que os há em abundância paredes-meias com a ostentação e o luxo mais aberrante, ainda se tolerava. Mas o jornal em vez de se cingir às coisas da "seita do Nazareno" alimenta a coutada da "seita do Alberto João", entrando abertamente na liça política, atacando ferozmente quem combate a corrupção e as ilegalidades, e colocando nos altares quem pratica tais desmandos. Ou seja: coloca-se ao lado dos prevaricadores e não ao dos que denunciam essa prevaricação.
A Deus o que é de Deus e a César o que é de César!
Em Braga há um cónego que usa as vestes clericais para tentar intimidar o poder judicial. Ainda há tempos, num jantar que englobava os maiores ricaços da zona (80% do PIB no estulto dizer de um jornalista) ele defendia um amigo acusado de corrupção na câmara de Lisboa, incendiando os ânimos contra quem tem o sagrado múnus de ministrar a justiça. Se se assumisse como o cidadão X, sem a roupagem clerical, ainda se tolerava, mas vir à liça enxovalhar a justiça para defesa de alguém que, ao que tudo indica, navega nas águas turvas da ilicitude, não é digno nem para si próprio nem para a Igreja Católica.
Não se ouviu um tugir ou mugir pedagógico da hierarquia! diz o nosso povo, e se calhar todo o mundo, "quem cala consente"!
Assiste-se nalgumas autarquias a um autêntico circo mediático em que alguns párocos usam jornais e até o púlpito para apoiar quem manda (normalmente os presidentes de câmara no poder). Isto é mau, isto é vexatório. Isto é degradante!
Fala-se muito no anticlericalismo reinante na Primeira República. Esquece-se que ele radicou na hostilização popular a uma Igreja sempre servil, sempre subserviente e apologeta a uma monarquia corrupta, decadente e sem estofo moral para reinar e galvanizar um povo ávido de justiça social e de desenvolvimento a todos os níveis. A Igreja de então foi a muleta negra da monarquia. Suportou-a até ao seu desmantelamento total, serviu de caixa de ressonância ideológica de uma monarquia sem valores, sem dignidade, atolada na mais vil corrupção e no despotismo.
E o que se passa agora?
O presidente da República bem clama por leis moralizadoras pois elas são actualmente incentivadoras (e protectoras) da corrupção mais degradante. A AR faz ouvidos de mercador.
O país atola-se no lamaçal da corrupção mais fedorenta. A Igreja, tal qual o fazia aquando do estertor da monarquia, vai a reboque, não denuncia (como seria seu dever moral e cívico) o regabofe, mais parece interessada em devorar o ágape que lhe é facultado pelos responsáveis pela orgia orçamental.
A História repete-se. A dinastia de Bragança foi-se, a dinastia de Abril está a ser contaminada pelo cancro da corrupção, pelo vírus do tráfico de influências...
Caríssimo Papa,
Apetece-se parafrasear um grande escritor que teve a coragem de denunciar tudo isto no seu tempo (isto está cada vez mais parecido): "Este país é uma choldra!"
...E a Igreja Católica está nela até ao pescoço...

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