domingo, julho 19, 2020

AO PROVEDOR DO POVO

SENHOR PRESIDENTE DA REPÚBLICA:

Diz V. Excelência com frequência que estamos no mesmo barco, e concordo totalmente. Diz que os jornalistas devem ser implacáveis no escrutínio da coisa pública.Há conceitos que devem ser tomados como mandamentos. Igualdade de oportunidades, equidade fiscal, transparência, integridade, enfim, um rol de sãos princípios que devem ser implantados nos vários segmentos da sociedade.
Fala-se agora em frugalidade. Eu conheço bem a palavra. Tinha oito e nove anos e levantava-me às cinco da manhã a conduzir uma junta de bois enquanto o meu pai com a calejada mão,  movimentava   o arado para lavrar a terra. Às nove horas, depois de um caldo verde frugal, já estava na escola, que distava cerca de um quilómetro, e era sempre dos primeiros a chegar. Fizesse chuva, fizesse frio, era isto frequente nos meninos do meu tempo de escola.
Frugalidade é um termo que nem todos conhecem: os banqueiros corruptos que deixaram o país na lama, alguns políticos que saquearam o erário público com manobras e esquemas sofisticados mais parecendo gangster de colarinho branco, enfim, toda essa corja de malfeitores que por aí andam a ser condecorados, a ser homenageados por toda uma populaça acéfala e narcotizada por uma comunicação social nem sempre isenta, sem sempre lúcida, nem sempre digna de respeito.
Um viver espartano, com rigor e austeridade nos gastos, exige-se a todos sem excepção! E o bom exemplo deve vir de cima!

O PR deve fazer pedagogia, e exercer a sua magistratura de influência sem colidir com o dever de reserva e o respeito pelo princípio da separação de poderes.

Veja o que se passa actualmente nos domínios do futebol, a calamidade que por aí vai (quase todos os clubes sem excepção) onde a opacidade  impera, a delapidação de recursos é impressionante, o esbanjamento anda de braço dado com práticas de evasão fiscal monumentais, proporcionando o enriquecimento ilícito a uma pequena "elite" que vive na opulência e nem se dá conta do "barco" nacional onde há os sem abrigo, os desempregados, os jovens sem ocupação, os miseráveis em todos os domínios.
E estes "miseráveis" não sabem que a economia é um sistema de vasos comunicantes (o tal barco colectivo),  e que, o  que esbanjam sem necessidade, só para manobras mediáticas destinadas a ocultar criminalidades e práticas abjectas que ofendem os mais elementares princípios de transparência e de honradez, poderia ser aplicado em tantos e tantos empreendimentos capazes de mobilizar a sociedade para a regeneração que se impõe?

Alguém explicou a estas criaturas o conceito do custo de oportunidade?

Alguém lhes pode explicar que quando recorrem aos bancos para financiar estas megalomanias, estarão a sobrecarregar ainda mais a depauperada economia nacional,em última instância, o sempre fustigado contribuinte?

Se não sabem, era bom que o Senhor Presidente da República, com os holofotes da comunicação social bem focados neste imperativo cívico, lhes dissesse, alto e bom som, que a frugalidade é para todos, pois o barco é colectivo e quem abusa dos recursos é um predador, um potencial criminoso. É como se estivéssemos numa grande seca e houvesse uma minoria de lunáticos a esbanjar água...
O que se passa nalguns clubes é aberrante. Jogadores pagos a peso de ouro e encostados, por não quererem mudar de clube (é direito legítimo), outros comprados para pagar "favores" e logo de seguida emprestados arcando o comprador com parte ou totalidade de salários. Isto, doa a quem doer, é um atentado aos sãos princípios da racionalidade económica empresarial, é um abuso, um insulto ao povo que passa fome, que vive na mais cruel frugalidade!

E os países do norte da Europa, ao assistirem a estas cenas de delapidação de recursos, no futebol,  têm carradas de razão. Os salários principescos pagos a artistas da bola são obscenos, sobretudo no contexto actual!

Uma dor profunda, um sentimento de revolta me invade e ouço os murmúrios e os lamentos dessa grande maioria silenciosa que vive no Portugal profundo e não vai à bola por falta de recursos, contudo, indirectamente,  também contribui para estas megalomanias,  pois o barco nacional a isso obriga.
 Quando os bancos que financiam estas trapalhadas, começam a soçobrar e pedem ajudas públicas (de ordem fiscal ou outras)  todos pagam, e eu pergunto: ninguém põe um travão nisto?

Têm medo do poder mediático dos detentores do poder neste mundo paralelo que passa ao lado da frugalidade à custa de todos nós, de todos os contribuintes?
Como é possível as televisões gastarem tantas horas a ouvirem os discursos patéticos, gongóricos, hilariantes (estilo "conversa mole para boi dormir"),  destes ídolos de pés de barro?

Senhor Presidente, peço-lhe encarecidamente: seja um verdadeiro Provedor do Povo, faça pedagogia, abra os olhos a este povo macambúzio e narcotizado por uma comunicação social controlada por este naipe de criaturas sem um resquício de dignidade, sem uma réstia de austeridade nos hábitos, sem saber que a sua falta de frugalidade provoca a frugalidade forçada em toda a comunidade, no barco-Portugal.

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